Dr. José Ewerton Nóbrega
ex-procurador de Justiça do Estado e advogado

O jornal Correio da Paraíba de 28 de outubro de 2014 publica artigo intitulado “Hipocrisia de insensatos”, de Valério Bronzeado, promotor de Justiça da comarca de Cabedelo. Embora devote ao colega grande admiração pelo zelo com que conduz sua função no Ministério Público do Estado, peço-lhe desculpas para discordar totalmente dos seus dizeres. Valério, secundando argumentos do seu falecido pai, Luiz Bronzeado, defende ardorosamente a instituição da pena de morte no Brasil, ao sustentar que o corretivo extremo reduziria a delinqüência neste país (hoje, sabidamente, uma das mais elevadas no mundo). Por fim, chega ao absurdo de afirmar que a pena capital seria um “ato de misericórdia” a esses criminosos, salvando-se a sociedade da convivência com eles.

Em outra oportunidade passada, escrevi contra a instituição da pena de morte no Brasil. Aduzi que a pena capital é inaceitável no plano moral-filosófico, sob a razão, maior e sublime, de que toda a pessoa humana, por mais execrável que seja, é portadora de dignidade, essa, sim, um apanágio que não lhe pertence, mas que é patrimônio da Humanidade. Portanto, o delinqüente, ao cometer o crime, por hediondo que seja, perde a liberdade (ao ser preso e eventualmente condenado), mas não pode ser privado de sua dignidade humana. No Brasil, essa pena é temporária, de acordo com o normativo vigente. Por outro lado, o argumento político-histórico condiz com a observação de que os Estados que no passado adotavam a penalidade extrema, como os países europeus, aboliram a medida dos seus códigos penais, substituindo-a, nos casos graves, pela pena de prisão perpétua.

Arquivaram-se a guilhotina e a forca. Mesmo nos Estados Unidos da América onde as unidades confederativas têm autonomia para definir os crimes e adotar a pena correspondente, a pena capital que, no passado, era aplicada, se não me equivoco, por todas elas, vem, paulatinamente, sendo substituída pela prisão perpétua (“life penalty”), conforme amplamente divulgado. A medida extrema, contudo, permanece sendo aplicada em diversos países como China e estados de religião muçulmana – o que, segundo penso, já se constitui uma minoria no contexto mundial.

Por fim, recordando as lições do célebre marquês de Beccaria, advogo ardentemente o princípio de que a vida é para ser preservada e não aniquilada. O Estado, que é (ou deveria ser) a soma das vontades dos cidadãos, tem que buscar os meios e as condições para ordenar e pacificar a vida das pessoas. Sabemos que nunca chegaremos à perfeição, tanto quanto que não vamos eliminar o crime da face da terra. Mas essa certeza não deve servir de pretexto ou para que nós nos desanimemos de lutar pela melhor convivência entre os homens, ou, pelo contrário, para que apliquemos medidas penais extremas que a sociedade mundial, majoritariamente, não mais aceita. Sonhamos – e sonhar é preciso! – com uma comunidade, nacional e internacional, na qual predominem o bom senso, a concórdia e a paz.

No mesmo jornal, edição de 29 seguinte, leio a longa reportagem sobre a instalação, ora em curso de execução, de máquinas eletrônicas (“scanners”) em dois presídios do Estado, para detectarem em bolsas ou outras bagagens, bem como no corpo dos visitantes, armas ou drogas ou quaisquer outros objetos ou substâncias nocivos à segurança do estabelecimento penal. A instalação, a cargo da Secretaria de Administração Penitenciária do Estado (SEAP) está sendo feita em dois presídios: o presídio “Des. Sílvio Porto”, no bairro do Roger, em João Pessoa, e o presídio do “Serrotão”, na cidade de Campina Grande.

Para mim, particularmente, a medida, embora iniciante e incompleta, é recebida com imensa alegria, porquanto, em outros artigos de minha autoria, me insurgi contra a prática freqüente da conhecida “revista íntima”, levada a efeito por agentes penitenciários, nas pessoas dos visitantes, especialmente das mulheres e crianças, familiares dos detentos, revista essa consistente na apalpação das partes íntimas dessas pessoas, obrigadas a se desvestirem de suas roupas íntimas e a se colocarem em posições para facilitarem a ação dos agentes.

Para toda a comunidade, igualmente, a instalação, agora, dos instrumentos eletrônicos, é recebida com alívio. Mas é preciso que sigamos vigilantes, seja para acompanhar a aplicação, de fato, dos novos procedimentos, seja para exigir do governo estadual a urgente e necessária ampliação da instalação desses instrumentos nos presídios faltantes e que são a grande maioria. Não se concebe que para o presídio de segurança máxima, localizado no bairro de Mangabeira, nesta cidade, esses instrumentos não tenham sido já instalados. É preciso mais ação das autoridades estaduais. Trata-se de medidas prescritas na Constituição Federal e na Lei das Execuções Penais, como afirmou a professora Luziana Ramalho Ribeiro, membro do Núcleo de Cidadania e Direitos Humanos da UFPB. E eu acrescento: é preciso que juntos lutemos para um dia apagar essa imagem horrenda e perversa do funcionamento do sistema prisional do Brasil.

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