Por: Esdras Marchezan
O agricultor Manoel Francisco Felizardo, 67 anos, ainda era um ‘rapazote’ – como ele mesmo explica – quando tomava banho nas águas do Rio Mamanguape e via vários amigos de seu pai tirarem do rio sustento para a esposa, filhos e netos, fosse através da agricultura ou da pesca. Ele morava com a família no município de mesmo nome do rio e, hoje, testemunha a importância econômica e social daquelas águas para milhares de famílias que moravam nas áreas beneficiadas pela bacia.
Nascendo no Planalto da Borborema – na região entre os municípios de Pocinhos e Areial – o Mamanguape banha municípios como Lagoa Seca, Alagoa Nova, Alagoa Grande, Mulungu, Mamanguape e Rio Tinto, numa extensão média de 3,2 mil quilômetros quadrados. Seus principais afluentes são os rios Araçagi e o Quandú, que contribuem com o volume d’água de sua bacia. “Mas as coisas já não são mais do mesmo jeito. Hoje, o volume é muito pouco e a serventia foi prejudicada por vários problemas”, denuncia seu Manoel Francisco, em referência ao processo de degradação que atinge a bacia do rio atualmente. Em alguns municípios por onde as águas passam, esgotos são jogados na correnteza, além do lixo depositado por moradores de áreas periféricas que contam com um sistema de limpeza pública deficitário. O manejo inadequado de culturas produtivas no leito do Mamanguape também é responsável pela ‘agonia’ que preocupa técnicos ambientais.
A equipe de reportagem do JORNAL DA PARAÍBA percorreu mais de 200 quilômetros de estrada para verificar a situação real de alguns trechos – no Brejo paraibano – por onde o rio passa e a constatação é de que sem apoio e conscientização da população e de autoridades, a revitalização total do Mamanguape vai se configurar em um projeto executado, mas sem os efeitos desejados.
Nos municípios de Alagoa Nova e Alagoa Grande, as marcas deixadas pela enchente provocada pelo rompimento de parte da Barragem de Camará, em 2004, ainda surpreendem. Espaços antes tomados por mansões de grandes produtores rurais abriram vaga para enormes crateras. Parte da mata originária foi totalmente extinta do lugar pela erosão provocada pela força das águas. A devastação ‘apagou’ a cobertura verde nas laterais do rio. A retirada indevida de areia causou a formação de poços em seu leito.
Cooperativa faz reflorestamento de áreas
No Sítio Vitória, em Alagoa Nova, em meio às pedras deixadas pela tragédia de Camará, um grupo de agricultores trabalha na plantação de 10 mil mudas para o reflorestamento das margens do Rio Mamanguape. O trabalho é comandado pela Coopacne (Cooperativa de Projetos, Assistência Técnica e Capacitação do Nordeste) através do financiamento de mais de R$ 3 milhões do Programa Petrobras Ambiental. Mais de 40 quilômetros já foram reflorestados com diversos tipos de mudas produtivas e florestais. O projeto de revitalização do rio contempla, inicialmente, as cidades de Esperança, Alagoa Nova, Areial, Montadas, Matinhas, São Sebastião de Lagoa de Roça e Lagoa Seca. No trabalho dos técnicos da cooperativa estão ações de reflorestamento, avicultura, agricultura, apicultura, recursos hídricos, capacitação de técnicos e políticas públicas.
Num grupo escolar da comunidade, os alunos recebem orientação ambiental e participam da construção de uma horta no quintal da escola. Até mesmo os funcionários de usinas e destilarias localizadas na região recebem orientação para que nenhum tipo de resíduo seja despejado nas águas, prejudicando o curso do rio. “Nosso primeiro trabalho foi a orientação destas pessoas, depois começamos as ações efetivas que hoje estão sendo executadas nos pontos que o projeto atinge”, disse Vânia Ferreira, técnica da cooperativa. O projeto é fiscalizado pela Petrobras.
O prefeito de Alagoa Nova, Luciano Francisco de Oliveira, é um dos parceiros do projeto e disse que o próximo passo é a construção da Escola de Mel, que deve beneficiar mais de 200 produtores de mel de abelha do município. “Será um investimento de quase R$ 300 mil para a construção deste projeto”, frisa.
Plantações são cultivadas no leito
Nos municípios de Araçagi e Mamanguape – que fazem parte do trecho por onde o rio passa – a plantação de cana-de-açúcar predomina na paisagem vista por quem passa pelas estradas do Brejo paraibano. Outros tipos de cultura também são cultivados às margens do rio, mas a utilização das águas do Mamanguape já não é mais tão intensa por parte dos produtores.
O superintendente da Agência Estadual de Gestão das Águas da Paraíba (Aesa), Sérgio Góes, disse que o nível de degradação é alto e preocupa devido à prática intensa da agricultura sem um manejo racional. “Sem este tipo de controle acabam acontecendo erosões e o assoreamento dos rios. Além disso, há pessoas que continuam utilizando agrotóxicos nas plantações localizadas nas proximidades do Mamanguape”, destaca o superintendente. Mesmo assim o rio continua viabilizando a irrigação e prática da piscicultura servindo de transporte de uma riqueza muito importante para o Estado, segundo assegurou Sérgio Góes. Para ele, a realização de projetos como o patrocinado pela Petrobras são importantes para ‘mexer’ com a sociedade em busca da conscientização ambiental para prolongar a vida dos rios paraibanos. Um levantamento realizado pela Companhia de Água e Esgotos da Paraíba (Cagepa) pelo menos 15 rios paraibanos vêm sendo alvo da emissão de esgotos há mais de 50 anos. O Mamanguape é um deles.